João da Cunha Vargas
nasceu em 28/12/1900 e não foi além das primeiras letras e, como ele mesmo
costumava dizer, não era ‘muito manso de livros’. Certamente aprendeu os
segredos que nos conta ao ranger dos bastos e no tranco das tropeadas, talvez
por isso sua poesia mais que repete o que o povo diz, ela tem uma inscrição
pessoal poucas vezes vista.
DEIXANDO O PAGO
Alcei
a perna no pingo
E
saí sem rumo certo
Olhei
o pampa deserto
E
o céu fincado no chão
Troquei
as rédeas de mão
Mudei
o pala de braço
E
vi a lua no espaço
Clareando
todo o rincão.
E
a trotezito no mais
Fui
aumentando a distância
Deixar
o rancho da infância
Coberto
pela neblina
Nunca
pensei que minha sina
Fosse
andar longe do pago
E
trago na boca o amargo
Dum
doce beijo de china.
Sempre
gostei da morena
É
a minha cor predileta
Da
carreira em cancha reta
Dum
truco numa carona
Dum
churrasco de mamona
Na
sombra do arvoredo
Onde
se oculta o segredo
Num
teclado de cordeona.
Cruzo
a última cancela
Do
campo pro corredor
E
sinto um perfume de flor
Que
brotou na primavera
À
noite, linda que era
Banhada
pelo luar
Tive
ganas de chorar
Ao
ver meu rancho tapera.
Como
é linda a liberdade
Sobre
o lombo do cavalo
E
ouvir o canto do galo
Anunciando
a madrugada
Dormir
na beira da estrada
Num
sono largo e sereno
E
ver que o mundo é pequeno
E
que a vida não vale nada.
O
pingo tranqueava largo
Na
direção de um bolicho
Onde
se ouvia o cochicho
De
uma cordeona acordada
Era
linda a madrugada
A
estrela d'alva saía
No
rastro das três marias
Na
volta grande da estrada.
Era
um baile, um casamento
Quem
sabe algum batizado
Eu
não era convidado
Mas
tava ali de cruzada
Bolicho
em beira de estrada
Sempre
tem um índio vago
Cachaça
pra tomar um trago
Carpeta
pra uma carteada.
Falam
muito no destino
Até
nem sei se acredito
Eu
fui criado solito
Mas
sempre bem prevenido
Índio
do queixo torcido
Que
se amansou na experiência
Eu
vou voltar pra querência
Lugar
onde fui parido.
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